Histórias de Moradores de Candeia

Esta página em parceria com o Museu da Pessoa é dedicada a compartilhar histórias e depoimentos dos Moradores da cidade.

História da Morador: Geraldo
Local:
Bahia

A missão da militância

Sinopse:

Geraldo nos fala sobre seus pais e avós, sobre sua infãncia na cidade de Candeias-BA. Fala do trabalho de seu pai na Refinaria de Mataripe, seu retorno aos estudos com 20 anos e sua mudança para Porto Alegre, acompanhando seu cunhado que viria a trabalhar na Refinaria Alberto Pasqualini. Nos conta sobre sua formação como cirugião-dentista e sua entrada na Petrobras, em 1964. A partir daí, nos informa sobre sua entrada para o SINDIPETRO, onde ficou de 1971 a 1987. Vemos a história de várias greves e negociações ao longo deste tempo, de sua família e os sonhos de Geraldo para o futuro individual e do país.


História
:

Geraldo Lúcio Góis Cruz, nascido no dia 24 de março de 1943, na cidade de Candeias, Estado da Bahia.

FAMÍLIA

Meu pai chamava-se Lourival Cruz, e a minha mãe, Genoveva Góis Cruz. Meu pai era alfaiate, era tido como um bom alfaiate, e a minha mãe era dona de casa, que ajudava na economia do lar - na época da festa, Padroeira, ela vendia miudezas, santos, véu, algumas coisas ligadas à prática religiosa, católica.

A região no passado ela pertenceu, ela pertence à região do Recôncavo baiano, entende, cuja economia era agricultura, mais especificamente açucareira. No período mais remoto ela vivia da produção açucareira, através dos engenhos, tanto que ainda tem lá nomes que permanecem até hoje ligados a esse período dos engenhos de açúcar. Depois a indústria do petróleo foi o grande, eu diria, filão, sustentação da economia local e já está em outro dinâmica, mas na época praticamente era a Petrobras, antes Conselho Nacional do Petróleo, depois Petrobras.

Meu pai trabalhou na Petrobras. Eu diria assim uma lembrança não muito boa desse período que ele trabalhou, fora o fato de ele me proporcionar aquele convívio. Ele trabalhou na Refinaria de Mataripe no início da obra, na época ainda pertencente ao Conselho Nacional do Petróleo, deve ter entrado por volta de 1949, 50, eu não tenho bem presente. Então esse período me ensejou contatos com Mataripe, aquelas coisas, aquelas novidades, aquelas plantas. Tudo aquilo para o imaginário da gente é uma coisa, para as crianças de hoje é uma coisa muito simples, muito banal, muito corriqueira, mas naquela época só quem teve um episódio que realmente nos marcou profundamente que foi a demissão dele. Ele já entrou com uma certa idade, na época o recrutamento se dava de uma maneira muito simples, muito singela, muito empírica, e à questão de limites de idade não se atentava, ele trabalhou lá 9 anos e 6 para 7 meses, e pela época legal tinha a questão da estabilidade.

E era muito usado na mesma na, aí já era Petrobras, quando ele foi demitido. Existia aquela orientação gerencial de evitar que o empregado conquistasse estabilidade, ou seja 10 anos, a partir dos 9 anos, 6 meses e algum dia já tinha direito à estabilidade, o que limitava enormemente o empregador de demitir - falta grave, justa causa aí, assim mesmo questionava na Justiça. Eu sei que botaram ele para fora, entende, e uma das coisas que poucas vezes eu vi ele se queixar, ele disse: “Olha, eu trabalhei todo esse tempo, faltei um dia por um acidente que teve”, um esmagamento de um dedo na porta da condução que fazia o transporte e não reconheceu isso, depois a gente passou dificuldades, dificuldades realmente muito grandes, entende, e essa coisa realmente me marcou, coisa que jamais eu levei assim como espécie de resquício de vingança, mas me marcou no sentido de eu sempre procurar lutar para evitar que outros pai de família passassem o que ele passou - e a gente por conseqüência.

Meus avós maternos, os quais eu não os conheci - ou melhor, conheci somente a avó, avó eu conheci, era Ana de Araújo Góis, e o avô, Lúcio de Araújo Góis. Os paternos, Manuel Cruz e Maria Serpa Cruz, não os conheci.

INFÂNCIA EM CANDEIAS

Até os 20 anos eu vivi em Candeias, desde a data do meu nascimento até os 20 anos, sempre morando em Candeias, né? Eu diria como toda a infância de quem nasce no interior, realmente vida saudável, vivia relativamente feliz, porque a região é de muita dificuldade, em função da pobreza na época, né, que com o advento do petróleo, da indústria do petróleo - Candeias é o primeiro campo produtor, comercial do país -a situação melhorou para alguns. Deu assim uma nova, um curso à economia local, que até então ficava praticamente vinculada à questão religiosa, que existe até hoje, com a igreja cuja Santa, a Padroeira, era credora de milagres e isso ensejava o afluxo de pessoas para pagar promessas. Então aquilo, em alguns períodos do ano, mais precisamente entre final de janeiro até março, abril se vê assim como uma espécie de injeção na economia da cidade, na época não era cidade, era um distrito da capital de Salvador.

As limitações de poder aquisitivo, enfim, dos meus pais, exigiam de nós muita criatividade na invenção de brinquedos. Não se tinha o que hoje é muito comum, o papel da indústria de brinquedo para suprir essa necessidade infantil. Então a gente tinha a bola de gude, o triângulo, o furão, que era um instrumento perfurante, era um jogo que se fazia num terreno baldio e arenoso. Enfim, a raia - para vocês aqui, pipa, né? - e matagal, que era muito intenso, frutas de época, goiaba, jenipapo, manga, aquelas coisas características da região que por safra servia como diversõo, ocupação para a gurizada. E aqueles brinquedos - picula, bar bandeira. Bar bandeira consiste numa espécie de lutas entre grupos, estabelece um limite de território e se distribuem em números iguais as crianças, os meninos. O jogo consiste em invadir o território do outro sem se deixar pegar - quando é pego vai preso, tem uma espécie de uma prisão, uma área delimitada. Para os que sobraram do outro lado, a façanha é ir lá e libertar os que estão presos, se dá com um toque de mão e aqueles que estavam presos, libertos têm que sair, porque os donos do território estão ali, né, enfrentando para segurar, para prender de novo ou impedir que um invasor salve os que estão presos. Então é uma brincadeira de muita emoção, de muita ação.

E realmente isso aí eu guardo até hoje na memória, tentei lá no meu condomínio, já depois de marmanjo introduzir, mas não foi bem aceito. E uma outra coisa - que aí está vinculada à questão do petróleo -, a gente brincava muito nos equipamentos do campo de petróleo de Candeias e zonas vizinhas, nos poços de produção, nos cavalos-de-pau, que são aquelas bombas que extraem petróleo. Então aquilo servia e às vezes até de maneira uma espécie de prática de vandalismo, na visão infantil não se tinha muito espírito critico de ver que aquilo tava errado. Então hoje eu me considero assim um ferrenho defensor da Petrobras, do monopólio; na minha época de infância eu fui de uma certa forma, dando os devidos descontos, um vândalo nos equipamentos - como volante de válvula; a gente tirava para fazer carrinho de mão, entende, coisas desse tipo, mas que realmente eu acho que foi um período que marcou.

De certa forma o prejuízo era de quem operava, num determinado período eles faziam assim uma espécie de uma fiscalização intensa, encontrava na rua e a grande maioria dos trabalhadores residia em Candeias mesmo, por ali, encontravam carrinho de mão com uma válvula, confiscavam, pegavam, e a gente tinha todo um receio de se deixar pegar por esses trabalhadores, mas o prejuízo maior não é esse não, mas eu acho que a partir de etapas da vida, entendeu, acho que esse período deixou alguma lição para a gente, pelo menos para mim.

Ainda na época do conselho tinha alguma coisa, mas não assim com uma visão social, não existia essa visão. Havia uma espécie de endeusamento até pelas limitações, principalmente econômicas, da população. O chefe era chefe de campo, o engenheiro era tratado como doutor e tudo, havia - o que aliás é a cultura que se perpetuou na empresa, que era uma empresa de engenheiros. E a origem, o nascedouro é essa época realmente, como o petróleo é marcadamente no seu início naquela região. Mas não tinha. Um período depois, já com a estrutura de apoio da Refinaria de Mataripe desenvolvida, com serviço médico etc., algum tipo de coisa, com limitação, contemplava a população de Candeias, mas não era muita coisa. Algum tempo depois teve - principalmente no inicio da década de 60, já os sindicatos formados, com toda atuação - algum tipo de ação de atividade da estrutura voltada para a população, mas eu diria assim muito limitado, entende, realmente muito limitado.

“O PETRÓLEO É NOSSO”

Na escola eu me lembro do início da campanha “O Petróleo é Nosso”, que foi muito forte, entende, houve envolvimento muito grande, e tinha aquelas pregações na escola a respeito da necessidade de conquistar o petróleo. Falava-se muito dos primórdios das campanhas de falar sobre a existência do petróleo, o retrospecto se faz, se vê que o primeiro grande embate do petróleo no país foi provar que tinha, porque a campanha era no sentido de negar a existência. Então a escola desenvolvia palestras, enfim, e situações eventuais como criança a gente ia para a rua com a bandeira do Brasil, “O Petróleo é Nosso”, aquelas coisas todas.

Então o desespero de escola foi isso, vinculado à questão petróleo, eu me lembro muito disso. E ainda sobre a infância, se eu posso retornar um pouco, recentemente eu estive na Bahia por uma situação familiar e ensejou que eu fizesse uma reflexão de um retrocesso da minha vida, então eu me lembrei que a minha mãe contava muito a respeito do Oscar Cordeiro, foi o pioneiro, que sustentou a prova da existência do petróleo. Ela contava que o Oscar Cordeiro namorava com a vizinha dela em Salvador e houve situações de perseguição policial em função da militância dele e tal, escondia o Oscar Cordeiro. E contava um fato realmente muito interessante, que no município, no município não, no distrito de Lobato, que fica na área metropolitana de Salvador, onde foi descoberto petróleo, estourou na delegacia de polícia uma encrenca entre dois roceiros, cujas propriedades, suas levas, ficavam num terreno acidentado.

O roceiro que tinha a parte mais alta foi acusado pelo roceiro que tinha a parte mais baixa de ter jogado querosene para prejudicar a plantação dele. E se constatou depois que na realidade era petróleo já brotando, aflorando. Então eu estava me lembrando na infância desse episódio que minha mãe me contava. E da escola é isso aí, entende, aquela geração foi marcada, principalmente naquela região, pelas campanhas “O Petróleo é Nosso”, e depois está aí o resultado, toda aquela negativa: “Não tem competência, não tem recurso, não tem tecnologia”, e está aí esse gigante hoje.

REVOLUÇÃO DE 64

Eu era empreiteiro em 1964. Em 64 Brizola já não era mais governador, era outro, era Ildo Meneghetti, e era um pensador de direita, pensador talvez seja generoso, mas era um político direitista. Olha, às vezes, nós temos lá integrantes da comissão em número reduzido que se mantêm religiosamente nas nossas reuniões, que se dá uma vez por semana , às vezes a cada 15 dias. E a gente faz exercício de memória. Tem um companheiro, o Floriano - é um jornalista, inclusive, que trabalhou na refinaria e foi cassado em 64, depois retornou como anistiado, então a gente viaja muito no tempo. Eu acho que era uma Porto Alegre excepcional sob todos os aspectos, quando eu digo que para mim foi muito gratificante eu ter ido, eu coloco muito do que eu assimilei sob o ponto de vista político, era rico politicamente, era rico, a cultura ainda permanece, entende, existia aquele glamour da Porto Alegre dos anos 60, realmente inesquecível. E politicamente era uma efervescência, realmente era com a predominância de uma ideologia, uma prática eu diria bem progressista. Eu, no início meio acanhado, vindo de dirigente de grêmio estudantil, mas em outro contexto, dentro de um cenário muito vinculado à direita. Existia, eu diria, um exercício intenso daqueles programas oriundos dos irmãos do Norte, com a Aliança para o Progresso, tudo aquilo. Mas eu acho quando eu falo em régua e compasso, embora de uma maneira empírica, eu assimilei muita coisa em casa, mais precisamente com a minha mãe. Então eu diria assim, eu cheguei lá contaminado com a visão de justiça e aquele cenário, aquele envolvimento, aquela convivência no primeiro ano ainda de empreiteiro despertava curiosidade em acompanhar. Como eu coloquei, as assembléias da Associação, muitas eu assisti da janela, ficava lá fora, aqueles debates em defesa da Petrobras, enfim, e realmente foi muito bom, muito gratificante. Era uma Porto Alegre agitada no bom sentido, movimento estudantil vivo, vibrante.

A gente tem um episódio ligado ao setor petróleo que revela bem isso, os estudantes do Diretório Central da UFRGS fizeram uma campanha que teve adesão da escola secundária, entre elas uma que era referêcia - Escola Estadual Júlio de Castilhos, que na época da campanha “O Petróleo é Nosso” teve um envolvimento muito grande. Eles erigiram uma torre, uma réplica de uma torre de petróleo numa praça central de Porto Alegre, praça da Alfândega. Ela ladeia essa rua da praia que eu citei aí no depoimento, a rua dos Andradas. Quando estourou o golpe militar, por algum tempo - eu diria de 64 até 68, quando houve aquele corte violento, né, que é o AI-5 -, os estudantes faziam manifestações. Faziam, havia ainda militância política, e o que eles faziam? “Ah, tem um comício-relâmpago ali num determinado ponto da área central”. Aí, daqui a pouco chegava a repressão, eles corriam e daqui a pouco um subia, trepava lá na torre e de lá dava continuidade, a torre de petróleo. Tanto que algum tempo depois retiraram. Já em anos, já em 86 parece, um vereador que na época era estudante, descobriu num depósito da Prefeitura a torre, aí fez uma campanha lá com apoio do prefeito de então e recolocou na praça, em outro local, a torre. Um ano após a promulgação da Constituição em 89, 3 de outubro de 89, a comissão fez um monumento em frente à torre, que é um losango estilizado daquele antigo símbolo da Petrobras com uma placa assinalando, homenageando os brasileiros que lutaram junto conosco na Constituição de 88 pelo monopólio do petróleo. Até o professor Eusébio Rocha foi quem descerrou essa placa. Eusébio Rocha é uma figura que eu acho uma injustiça não mencionar no meu depoimento o que foi essa figura, essa pessoa, esse cidadão brasileiro, como patriota, nacionalista em prol da causa do petróleo. Esteve conosco em várias oportunidades - iniciativa da comissão, assinalando 3 de outubro, enfim, ele esteve lá, debates, enfim, aquele período anterior da época dos Seminários Energéticos, ele sempre foi figura presente nesses seminários. O professor Eusébio Rocha estava sempre presente debatendo a questão petróleo, e Porto Alegre era assim, como diz a música, “Era demais”, realmente era um período rico, eu tenho na memória saudades.

RETOMADA DOS ESTUDOS

Eu saí da Bahia levando uma transferência, do ginásio em que eu estudava em Candeias. Eu iniciei o segundo grau aos 20 anos, porque ao concluir o curso à época chamado de primário, 11 para 12 ano,s não tiveram meus pais condições de me proporcionar o estudo secundário. Na região não existia, e teria que ir para Salvador e não tiveram condições de bancar. Então aos 20 anos eu resolvi voltar a estudar, e quando saí da Bahia, na metade do ano, em julho, eu levei transferência, me matriculei num colégio em Porto Alegre. Mas não consegui manter, porque em seguida à minha chegada eu comecei a trabalhar numa empreiteira, na obra da refinaria, e o deslocamento era muito cedo. Eu não tive pique para, até porque o clima contribuiu muito contra - acordar cedo no inverno, para um nordestino acostumado com uma temperatura bem mais amena, mais agradável, realmente não era uma tarefa fácil. Depois eu me recompus, enfim, voltei a estudar. Por fim, algum tempo depois eu concluí o segundo grau e depois a universidade.

Eu fiz curso de cirurgião-dentista. Mas não trabalhei, quer dizer, praticamente não, eu me formei em 79, dezembro de 79, e tentei, para não atrofiar, vincular, ficar vinculado à profissão, e fiz durante um período um atendimento voluntário na Santa Casa de Misericórdia em Porto Alegre. Mas não deu para acompanhar, porque a demanda sindical era muito grande, a idéia que eu tinha - nessa altura já tinha família constituída. E era uma espécie assim de reserva, eu temia até por exemplo de companheiros que sofreram reveses no movimento sindical, de repente, enquanto era eu sozinho era tudo festa, mas com compromisso de família eu me preocupei em ter uma espécie na reserva se eventualmente sofresse algum revés teria ao que recorrer pra sobreviver, mas a cachaça do movimento sindical realmente prevaleceu, e eu mandei para o ar o curso e nunca exerci, a não ser esse período de voluntariado na Santa Casa de Misericórdia.

MIGRAÇÃO

Fiquei mais ou menos um ano na casa do meu cunhado, um ano e pouco depois tomei meu rumo. Tomei meu rumo - um ano e meio seguramente, eu acho que dois anos. Eu era solteiro. Eu tenho assim grata recordação, a época era infinitamente mais humanizada, praticamente não existia violência, se a gente se reportar aos dias de hoje, era realmente muito boa, aquele glamour, entende?

Eu sempre fui aficionado por cinema e realmente era pródigo cinema na época. Existia a rua - seria hoje, na linguagem da mocidade, dos magrinhos, o point da época, a rua da praia -, a rua dos Andradas, que tinha inúmeros cinemas e realmente eu era aficionado e freqüentador assíduo de cinema. E no início foi, até travar relações, foi assim a minha diversão. Depois a gente vai entabulando, vai conhecendo pessoas, entendeu, travando amizades, conhecendo pessoas.

Realmente nos primeiros dias eu diria assim eu me sentia em outro país. Eles moravam num bairro predominantemente de israelitas, então eu me lembro bem nos primeiros dias caminhando pelas ruas do Bonfim, o nome do bairro, e estava o pessoal na língua. Eu me sentia em outro país, tudo diferente, a predominância do europeu, a retina meio desacostumada, acostumado com o bronzeado lá da Bahia, mas eu me aclimatei bem, assimilei bem os costumes - o gaúcho, em que pese essa aparência meio de empáfia, é um excelente, um exímio hospitaleiro.

Num determinado momento eu quis voltar à Biahia, mas depois que a gente cria raízes... Eu hoje sou um gaúcho inteiro, alguns dizem que sou baiúcho. Tomo chimarrão, eu assimilei bem a cultura, realmente assimilei. Casei-me com uma gaúcha, descendente de italianos, e a gente cria raízes. Eu diria que eu fui muito bem recebido no Rio Grande do Sul. Olha, confesso tenho uma dificuldade de me reacostumar com a Bahia hoje, eu estou com 60, saí com 20, são 40 anos, né, completando agora no dia 27 de julho.

INGRESSO NA PETROBRAS

É que é um vínculo muito grande com a questão petróleo, Petrobras. De 1957 até 1963 eu trabalhei em Mataripe, numa estrutura de apoio que existia, que consistia uma espécie de um shopping aberto, um open shopping como chamam hoje. Existia hotel, barbearia, padaria, mercearia, loja, cinema, alfaiataria e toda uma estrutura para atender aquela população que a Petrobras mantinha ali. Existia uma vila residencial, um alojamento para os empregados solteiros, serviço médico, restaurante, eu trabalhei nessa loja de 1957 até 63, testemunhei todo aquele período rico da questão política sindical e sempre alimentei, só que acho que calou mais forte o espírito nordestino aventureiro. Uma irmã minha, casada com um petroleiro também baiano, ele trabalhou na refinaria se não me engano até 60. Terminando a obra de ampliação da Refinaria de Mataripe, ele foi convidado para vir aqui para o Rio para trabalhar no terminal da Guanabara, na construção do terminal. Concluída essa obra ele recebeu convite para ir para o Rio Grande do Sul em 1962, para a obra da Refinaria Alberto Pasqualini. Eles que me ensejaram a oportunidade de ir para lá. E lá que eu entrei na Petrobras, inicialmente numa empreiteira, de 63 até 64; depois prestei concurso e lá eu entrei e sempre realmente podia ter entrado lá, seria o mais lógico, mas como eu registrei, eu frisei, existe aquele espírito aventureiro nordestino, aquela fixação pelo sul, né, Rio, São Paulo. Não tinha jamais pensado em dar com os costados, como diz o gaúcho, no Rio Grande do Sul, e estou lá até hoje, Graças a Deus.

Trabalhei na Secretaria Geral da Obra. A construção da refinaria foi de 62, a pedra fundamental é dezembro de 61, e a obra começou em 62, não sei bem precisar em que mês, mas foi em 62, concluída em setembro de 68. Foi quando iniciou a operação, a inauguração foi em 16 ou 18 de setembro. Eu trabalhei um ano e um mês, eu diria. Eu entrei em agosto, 7 de agosto eu entrei nessa empreiteira e saí por volta de 20, talvez 19, já concursado, para entrar na Petrobras, onde entrei em 20 de setembro.

AUXILIAR DE SEGURANÇA

Entre 64 até 67 e meio, por aí, as oportunidades eram praticamente inexistentes por ser obra, mas quando iniciou a operação, sim, realmente surgiram oportunidades de progresso funcional e tudo. Me decidi entre dois e prevaleceu um auxiliar de escritório e auxiliar de segurança em terra. Como no último as condições em termo de remuneração eram mais favoráveis, eu optei por esse último. Isso em 68; em 71 eu fui liberado para o mandato sindical, eu já pertencia ao sindicato, aí eu me entreguei de corpo e alma. Aí nessa altura a questão funcional foi negligenciada, até porque numa linha de frente havia muita restrição de ensejar progresso funcional, eu tinha que me definir e a minha definição foi dirigente sindical. Quando iniciou recrutamento para Campinas, eu me inscrevi para ir para Campinas, mandaram lá eu fazer umas entrevistas e tudo, e até hoje não me chamaram. Em Campinas, deve ter sido em 70, acho que 75 – não, eu não era casado ainda, acho que 74, 73, eu acho. Já estava na fase de operação de Campinas, que foi uma obra muito rápida. É claro que eu não estou esperando mais, já estou aposentado, eu tinha optado por dar um tempo: “Eu vou para uma Unidade nova, e tal”. Havia perspectiva também na ampliação do sindicato lá, como de fato aconteceu. Eu não sei se foi o envolvimento com o sindicato, realmente eu não sei, só sei que não me chamaram, outras pessoas, companheiros, colegas, não da minha atividade, mas de outras funções foram chamados, muita gente que foi transferida, principalmente pessoas que foram de outras unidades para lá no inicio da operação da Repar. E depois teve muita gente de Cubatão, do Rio, daqui da Reduc, e alguns optaram por ir para Campinas e foram sem problema nenhum. Eu não sei - não me chamaram, entende?

Eu fiquei no Sindicato de 71 a 87. Em 1987 retornei, acho que em outubro, se não me engano, de 87 eu retornei com a mesma função. Eu considero como uma das grandes experiências de vida que eu tive esse meu retorno à refinaria, entende? Existia uma cultura - não era generalizada - de que o dirigente sindical que retornava não teria disposição de se reintegrar, existia essa espécie de ti-ti-ti. E eu levei assim como ponto de honra retornar e desmistificar isso, não só me afastei da militância, tendo assim a presença do outro lado do balcão que é muito, muito rica. Mas fazer ver que não é assim, o dirigente sindical desempenha o papel e, ao assumir o seu posto de trabalho, eu diria que ele tem até mais um pouco mais de dever, de obrigação, entende? Para mim realmente foi bom, foi ponto de honra, me gratificou muito, né? Algumas coisas, algumas restrições... tem um episódio que eu jamais me esqueço - eu passei um período de readaptação trabalhando em horário administrativo e designaram um grupo de turno. Quando eu me apresentei numa zero hora, eu fiquei sabendo que tinham feito lá uma espécie de um bookmark em relação à barba, né, se tirava ou não tirava a barba, se tiravam ou não tiravam. O chefe imediato consultou o coordenador de turno para ver se eu podia assumir em função da barba, que na atividade não era usual, de pronto foi rechaçada a pergunta desse nível. Depois eu fiquei sabendo - o próprio cara veio me revelar: “Olha, eu andei perguntando, consultando o coordenador aí se podia, que eu não sei, não sei o quê”. Existia muito aquele enquadramento, aquele visão meio marcial, né, aquela proximidade que desvirtua um pouco a atividade, aquelas coisas de comunidade, de informação e tudo. De repente um subversivo está voltando, meio estranho no ninho, e barbudo – é, mas a barba ficou mantida até a aposentadoria, eu diria que até de uma certa forma contribuiu que algum tempo depois colegas de setor aderiram à barba. “Se ele pode, por que eu não posso?” Desse episódio eu não me esqueço, não é muito importante, mas é interessante no mínimo, né?

CONQUISTA DO SINDIPETRO EM 67

O sindicato a gente conquistou em 67. Ele foi criado antes, só que com o advento da Redentora houve intervenção - inclusive nós disponibilizamos ao Museu aí alguns documentos muito interessantes; eu diria até históricos, como um ofício do Comando do 3º Exército dando poderes ao interventor da obra para intervir também no sindicato. Mas eu não estava ainda na Petrobras em março, entrei em setembro.

O sindicato exerceu um trabalho, assimilei bem. Quando eu saí da Bahia eu era presidente do grêmio estudantil do colégio, evidente que tinha uma visão política bem diferente, mas eu diria assim que a régua e o compasso eu posso dizer que eu levei para o Rio Grande do Sul e indiscutivelmente foi aperfeiçoado só o ponto de vista de uma visão progressista de um processo político. E nisso acho que tive assim uma contribuição muito grande do setor onde eu trabalhei inicialmente na refinaria.

A associação é de 62, inclusive o documento que está disponibilizado tem a ata de criação. Já quando entrei na empreiteira, o fato de eu ter a vinculação do meu cunhado que trabalhava lá e o meu interesse político também eu trazia aquela coisa do grêmio estudantil, aquela coisa, eu assistia algumas assembléias da janela da associação, do lado de fora eu estou ali curioso, alguns embates em defesa da Petrobras, que para mim importava muito, eu assisti. E quando eu ingressei em setembro na Petrobras, peguei aquele núcleo de subversivos, como diziam na época. Realmente para mim foi de um valor imenso, eu passei a ter um espírito crítico apurado, no início eu fui meio refratário ao que eu ouvia, mas depois eu não diria que me enquadraram - eu que me enquadrei, eu me auto-enquadrei com o acompanhamento do processo, das discussões, enfim.

ENCONTROS NACIONAIS

Era Encontro Nacional de Dirigentes Sindicais do Petróleo, e se deu de 1964 até se não me engano 79, 80 e poucos - aí passaram a ser os congressos da categoria. Mas nós nos mantivemos unidos com uma série de dificuldades. Em termos de conteúdo, de alguns encontros a qualidade é questionável, entende? Mas se deram todos, e até um tempo atrás nós tínhamos, o nosso sindicato é talvez um dos poucos que tivessem todo esse acervo que consiste nas atas dos encontros, os ofícios revindicatórios. E eu diria assim que ele foi muito positivo, porque o nascedouro assim da questão que depois resultou na Federação dos Petroleiros - primeiro um tipo e depois a FUP -, nascedouros são os encontros. Nós chegamos a um ponto em que a conclusão dos encontros ficava meio solta, aí se instituiu a figura da mesa diretora do encontro, que tinha uma espécie de um mandato de um final de encontro até o seguinte. Tinha um papel de coordenação, ainda tênue, mas havia a figura central do segmento petroleiro. E foi aperfeiçoando: depois departamento, ligado à figura formal das CNPI, que é o que se tinha na época, sem se atrelar àquela política, sempre refutando. E o resultado depois foi nas federações - primeiro um tipo de federação, depois outro. Então isso foi uma façanha, as dificuldades eram enormes, eu testemunhei por várias vezes presença de pessoas que eram identificadas como ligadas à área de informação da própria empresa, do próprio SNI - e nunca se teve alguns cuidados; cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém, mas se discutiam e se encaminhavam as questões da categoria.

Eu acho que neste particular os encontros também desempenharam um papel interessante. Reunia, pegava a realidade do Pará, do Amazonas, uma do Rio Grande do Sul, uma do centro da Bahia, Alagoas, Rio Grande do Norte, Paraná, São Paulo. E também eu acho que pode ser enquadrado como uma espécie de exercício de humildade que na minha avaliação eu acho que foi positivo, entende, eu acho que contribuiu.

EPISÓDIOS DA VIDA SINDICAL

Nós tivemos uma articulação no movimento sindical no geral e mais especificamente no Rio Grande do Sul que foi a Intersindical. Figuras que hoje despontam na política estadual e nacional foram contemporâneas minhas e de outros companheiros dessa época, como Olívio Dutra, Paulo Paim; Olívio, numa fase mais... O Olivio era bancário, Paim era metalúrgico da cidade de Canoas, e outros companheiros que não deram continuidade no movimento sindical. Então a gente tinha um trabalho muito intenso e muito articulado. E se tinha situações de audiências, pedido de audiência com autoridades, governador do Estado, enfim. E algumas vezes de viver episódios que marcavam às vezes pela emoção, às vezes até pela singularidade, coisa meio folclórica. Um deles, que eu me lembro bem, foi a audiência. O governador recebeu uma comissão; os demais ficaram na porta do palácio, e um grupo de estudantes da antiga Libelu, que a gente conseguia conter para uma determinada coisa, de repente começou a fazer a pregação de uma maneira mais radical e mais imprópria para o momento. Então naquele momento a gente esteve prestes a levar umas borrachadas por inconseqüência de uma turma jovem mais, eu diria mais exaltada. Esse é um episódio, um outro ainda com esse grupo de companheiros foi o movimento desencadeado pelos operários da construção civil de Porto Alegre, cujo sindicato era muito atrelado ao patronato. Então houve uma articulação lá - eu diria assim, o mais interessante é que foi espontâneo, as pessoas que tinham a liderança nata em alguma coisa, mas não na política, de repente se voltaram, reconhecendo que havia algo de errado com a sua entidade, com os seus dirigentes, e fizeram uma assembléia num campo de futebol, numerosa, e o dirigente sindical foi retirado da tribuna de uma maneira meio, como diz na gíria, a tapa, literalmente. E o pessoal assumiu o controle, mas só que sem articulação, sem nenhuma experiência. Eles passaram a vagar pelo centro da cidade fazendo coisas não muito apropriadas. E nós nos reunimos emergencialmente, o grupo da Intersindical, e procuramos tentar orientar essa turma. Realmente, a única coisa que estava assim, eu diria, positiva - além de reconhecer essa adversidade da relação da entidade com quem os dirigia - era o fato de se manterem unidos, com toda a baderna fizeram uma confusão infernal. A polícia federal pinçou uns ali, e se mantiveram unidos. Aí nós procuramos esse pessoal, houve uma resistência grande - mais uma vez a Libelu estava à frente dos cabeças que foram identificados dentro do movimento, mas a gente conseguiu assumir, deslocamos o pessoal para a sede de um sindicato, enfim, acho que é uma coisa que realmente eu não esqueço. Na área do petróleo uma emoção forte que eu vivi foi na greve dos 11 dias. Eu fiz parte da coordenação do comando de greve, e num determinado momento que entramos para negociar com a superintendência, ao passar nas unidades realmente aquele silêncio realmente me marcou, entende? De repente o conflito entre o defensor da Petrobras instituição e o dirigente sindical que se opunha a uma gerência, a uma superintendência, a uma direção, aí realmente deu uma balançada - sob o ponto de vista emocional, marcou, isso. Um dos decretos que a gente conseguiu derrubar em Brasília, após a votação nos demos as mãos e cantamos o Hino Nacional. Também foi uma emoção forte, entende, também estava lá toda a cúpula do movimento, Lula - na época tinha a figura, não é de boa memória para uns, mas o Joaquinzão, você já deve ter ouvido falar, o Magri, todo mundo de mãos dadas, realmente havia aquela – circunstancial, mas havia - unidade, aquilo foi emocionante. A questão da Refap, essa aí realmente é já noutro contexto, também marcou muito.

GREVE DE FOME

Tanto que em 1965, 66, eu não sei bem precisar, nós participamos da articulação de um movimento que culminou numa greve de fome, isso na obra. O que para a época era uma façanha - não foi unânime, mas teve um contigente expressivo, houve eu diria assim uma conseqüência, teve gente que foi punida de maneira aleatória. Como não conseguiram identificar os cabeças, pegaram um que tinha militância e escolheram e puniram. O argumento para consumo externo era a qualidade da comida, mas eu acho que o grande, a compreensão que eu tenho hoje, na época ainda existia um pouco de infantilidade, naquela empolgação e tudo, mas eu diria assim a essência do movimento era um exercido de unidade. Quando eu entrei existia uma diretoria que sucedeu - praticamente os componentes eram os mesmos - à junta governativa, e o interventor da obra, com delegação do Comandante do 3º Exército, destituiu a diretoria eleita e nomeou a junta governativa, que teve prazo para convocar eleições. Só que a eleição... praticamente a composição dos que foram eleitos, a chapa única era a composição da junta governativa, e aquilo realmente ficava atravessado. Então a articulação nossa era mudar, se não me engano teve uma segunda eleição, porque o movimento foi de boicotar o quórum, existia pela legislação em vigor a época quórum qualificado numa primeira convocação, depois ia reduzindo na segunda, e a terceira era o que desse. E nós obrigamos uma terceira convocação, apregoando o boicote. Aí na eleição seguinte sim, essa aí nós fizemos, bancamos e derrubamos, depois que derrubamos, daí por diante disputamos com chapa única. A única coisa é que eu acho assim que na época não se podia esperar muito diferente, a gente conseguiu manter algumas linhas doutrinárias, ideológicas, até 1970, quase 80. Esse período, um pouco mais depois, eu diria assim um período um pouco mais repressivo da ditadura, eu acho que a questão petróleo ela foi muito presente, o período do Geisel, anos 70 - talvez o chumbo não fosse tão grosso no período do Geisel, mas era período de chumbo. O movimento sindical - e nisso aí o pessoal de São Paulo tem uma participação muito grande -, como forma de se reunir para defender a Petrobras, instituiu a figura dos seminários energéticos. Os seminários energéticos eram para consumo externo, fazia uma programação ali, mas na essência o que rolava mesmo era a defesa da Petrobras. Já nessa época se defendia a empresa como uma empresa de energia, a Petrobras como uma empresa, a questão do monopólio presente, de uma maneira muito incisiva, muito forte, então eu acho que desse período, assim o que eu posso falar mais. Nesse particular de se reunir, talvez nós sejamos a única categoria no país no período discricionário que conseguiu se reunir todos os anos.

MOVIMENTOS NOS ANOS 70

O movimento, ele, no final dos anos 70, principalmente depois do advento, daquela experiência rica do ABC dos metalúrgicos, o movimento sindical como um todo começou a dar ar de... Porque sair da letargia, aquela questão a que estava atrelado, cerceado sob todos os aspectos - e o movimento petroleiro de certa forma acompanhou, havia movimentos no final dos anos 70, início dos anos 80. Foi uma coisa esporádica, né, fazer cara feia para o chefe ou coisa desse tipo. Que eu tenha conhecimento, considerando que a repenta não fazia parte do movimento sindical, essa greve de fome deve ser um dos poucos movimentos que teve naquele período todo, até porque a Redentora ela, os sindicatos que na época eram pujantes, né? E eram unidades permanentes da empresa, os quais eram Cubatão, era a refinaria que tinha em São Paulo da Petrobras, Capuava era privada na época, a Reduc aqui no Rio de Janeiro, a RLAM, Mataripe na Bahia, lá eram dois - o sindicato da produção, e a área de estação era separada. Então foram desmantelados literalmente, a truculência, a violência com que os sindicatos foram ocupados, enquanto lá a coisa se processou um pouco mais civilizada, chega lá um coronel com um ofício do general do 3º Exército e tal, intervém, alguns pegam a documentação, dá um jeito de dar fim, nessa aí nós perdemos muita coisa. Mas na Bahia, pelo que eu tenho conhecimento e depoimentos que eu tive depois retornando, é violência explícita literalmente, botar um tenente que era famoso lá da Policia Militar da Bahia, invadir a sede do sindicato, botou tudo abaixo - quem estava lá sofreu agressão física. E eu acho que aqui também não ficou por menos, talvez um pouco menor, mas lá pra cima teria se dado em Alagoas, Sergipe, parece que no Pará também não ficou por menos. Então realmente a coisa sofreu esse processo de desmantelamento. Num primeiro momento houve uma certa intimidação, mas depois a coisa foi alinhando. Eu acho que essa realização dos encontros é um demonstrativo, havia, como é natural, o pessoal da região Sul, Sudeste, um pouco mais ousado nas posições, na militância, enfim, lá um pouco mais cauteloso.

OPERAÇÃO PADRÃO

Movimento sindical, voltando à questão do ABC, esse período do final dos anos 70, houve um movimento, eu diria um período em que se obteviveram boas conquistas. Já se fazia muito além de cara feia para o chefe. Faziam passeatas, atrasos, coisas desse tipo, e se conseguiram alguns avanços. Atrasos de início de trabalho, de jornada. Operação padrão, atrasar uma hora. Então se fazia a concentração em frente à unidade e aí se deliberava. E teve episódios marcantes no movimento sindical, aí já numa outra fase, mas eu diria o nascedouro nesse período, final dos anos 1970, né? O movimento sindical nacional já estava tomando rumos, no Rio Grande do Sul a gente já tem experiência com a Intersindical, que é uma articulação de mais de 300 sindicatos na região. E além de lá ,em outros Estados foi a origem, eu diria assim o nascedouro, da CUT se deu nesses movimentos. O que eu verifico hoje é que num movimento petroleiro especificamente houve um descompasso, entende, houve regiões em que por força da influência de um modelo sindical totalmente inovador, que é o caso do metalúrgico do ABC, ele ficou à frente dos demais - e aí está a questão do Sindicato de Campinas, que liderou um movimento em 1973, foi seguido pela Bahia. E os demais, realmente - eu com pesar revelo isso, porque pelo trabalho que a gente desenvolvia no Rio Grande do Sul depois por depoimentos dos companheiros de Campinas, havia uma aposta muito grande na gente, e realmente falhou. Tem uma série de razões, entende, questões que até hoje merecem um esclarecimento maior, pela questão de cúpula - que às vezes o baixo clero fica ali no processo, mas a realidade foi essa, eu acho assim que poderia... de uma certa forma a gente perder um momento histórico. Eles ficaram sozinhos.O governo na época era do Figueiredo, o ministro das Minas e Energia...

GREVE DE 1988

Fiquei afastado do sindicato 3 anos e pouco. Não assumi nenhum cargo, e eu acho que coincidiu - claro que não foi meu retorno que decretou isso, mas coincidiu assim eu diria o início do retorno do movimento mais pujante, fora aquele episódio de Campinas e Mataripe de 83; em 88 já começaram os movimentos apontando para um movimento paredista. Tivemos um avant première talvez em maio de 88, início de 88, a data não me lembro bem, que foi um movimento de vigília das unidades da Petrobras, onde o Exército, orientado pelo então presidente Sarney, ocupou as unidades. Realmente uma coisa meio violenta como protesto generalizado. E pouco tempo depois tivemos uma tentativa de greve - levou 48 horas; a adesão não foi total, mas eu diria assim que foi uma preparação mais pujante do que viria a acontecer em novembro: aí sim uma greve geral, de 11 dias. Oitenta e oito, 11 dias, e eu tive um envolvimento nessa primeira. Eu recebi uma punição, dois dias de suspensão, depois já num determinado momento foi revertido, mas houve isso, eu e outros colegas fomos punidos com dois dias de suspensão. Aí novembro sim, 11 dias era uma adesão total, foi considerada na época a maior greve no setor do petróleo no mundo. Foi geral, refinarias, campos de produção, foi geral.

O pano de fundo era salarial, a gente sabe que sempre tem algo a mais, no contexto sempre tem alguma coisa a mais. Ainda sobre movimento sindical, período do governo do general Figueiredo, aí já em conjunto um movimento como um todo, se teve um trabalho muito intenso em nível de Congresso Nacional, principalmente na derrubada daquelas leis salariais, limitações, aquelas coisas toda, aqueles decretos aí já apontando para um caminho da abertura. Tivemos derrubadas de decretos restritivos, de legislação salarial - ele decretava, e quando o Congresso apreciava a gente ia mobilizar metalúrgicos, entende, petroleiros, eletricitários, enfim, havia assim uma coisa bem articulada, de certa forma unidade, e se derrubaram alguns decretos do Figueiredo, decretos restritivos de legislação salarial. Na época da Constituinte, saindo um pouco da questão específica sindical, nós em termos de petróleo tivemos também uma atuação intensa na questão dos monopólios, principalmente no monopólio do petróleo. O movimento se articulou, instituiu a criação das comissões de defesa do monopólio do petróleo.

COMISSÃO CONTRA A PRIVATIZAÇÃO

Isso foi em 87, na época da Constituinte, e nós tivemos no Rio Grande do Sul a criação da nossa Comissão, que perdura até hoje. A origem é de congresso da categoria que orientou para a criação das comissões por Estado, tentando se articular com as demais, uma sociedade como um todo - até porque a questão do petróleo não é uma coisa especifica de petroleiro. Eu diria que de repente a gente incutiu que precisa ter um pouquinho mais de responsabilidade em relação aos demais - aí foi bom, durante toda essa trajetória, mas não é exclusividade, a Petrobras é do povo, a gente vai buscar a sua origem, vê que as discussões que demandaram nossa criação envolveram toda a sociedade, eu diria até uma espécie de fenômeno político, porque de repente se viu a direitona de braço com a esquerda. Então a gente criou as comissões, nós criamos as comissões estaduais, e a nossa foi criada nessa época. Vencida a Constituinte, a promulgação da Constituição, nós resolvemos mantê-la. A visão que a gente tinha, até tentou se articular nacionalmente, de que a luta efetivamente começava a partir dali, que além de consolidada a Constituição nós estávamos brigando contra o contrato de risco que se deu na época do governo Geisel, se brigou para ficar muito bem claro no texto constitucional que os contratos de risco estariam banidos, se incluíram mais algumas coisas em distribuição. Enfim, a gente achava que realmente, como de fato aconteceu, e se mantém naquele período do governo Collor de Mello, tentou quebrar os monopólios, as alterações no texto constitucional, depois veio o período do Itamar Franco, que deu uma segurada. Aí, com o nosso sociólogo a coisa azedou, se brigou, enfim, se esperneou, se fez campanha - realmente não houve como segurar.

Como eu disse, nós resolvemos manter, entende, claro que oscila, com períodos altos e baixos - até porque se luta com dificuldade para sustentar. Num determinado período, já na época do governo Collor e Itamar, o movimento sindical petroleiro articulou a criação do Movimento em Defesa do Sistema Petrobras. Tinha um caráter bem específico, a demanda era essa, estrutura própria, autônomo sustentado pela categoria. Aquele período realmente o papel, o trabalho foi eu diria bom, né, e até fiz parte da composição dele, desse movimento. Mas depois houve lá uma orientação, uma diretriz de extinguir e criar no âmbito da estrutura da FUP algum órgão que desempenhasse esse papel. Mas o movimento realmente ele teve um trabalho muito bom, atuou intensamente na época em que se discutia a reforma a Constituição, aquele período Collor e Itamar. Só que depois que foi para a estrutura da FUP, a coisa não teve a mesma desenvoltura, até pela questão de estar subordinado à estrutura, coisa que ele não tinha antes, porque era autônomo, coisa totalmente independente. A comissão gaúcha permanece, realmente permanece, a gente procura manter acesa a chama, as datas simbólicas a gente jamais esquece, sempre tem alguma coisa, por mais singela que seja, entende? É um informativo, um boletim assinalando 10 de maio, que é inicio da atividade da Petrobras em 1954, o 3 de outubro que é ali, 2004, e a gente tem uma data específica, o início da Refinaria Alberto Pasqualini, a inauguração, em 16 de setembro, então a gente atua assim, há uma espécie de eventuais parcerias com a Aepet, que nos subsidia com...

A associação dos engenheiros, que aliás tem sido parceira ao longo de toda essa trajetória. Mesmo naquele período anterior do movimento sindical, período ainda discricionário, a Aepet, em suas várias composições de diretoria, sempre foi aliada em defesa do monopólio. Naquele período dos Seminários Energéticos que eu citei aqui, nós tivemos sempre a presença da Aepet. E agora vamos remando aí, agora mesmo, 50 anos em 2004, a gente pretende algum tipo de programação que assinale com mais ênfase. Especificamente na área regional a gente vive um momento crítico. Por reestruturação de modelo, de empresa gerencial, enfim, criada a figura das Unidades de Negócio da empresa, e dentro da criação da figura das Unidades de Negócio surgiram as figuras das parcerias, e nós fomos contemplados, a Refinaria Alberto Pasqualini hoje já é uma empresa - eu diria assim, uma espécie de modelo de subsidiária.

PRIVATIZAÇÃO DA REFAP

Foi criada na Refap S.A., com parceria com a Repsol, que é uma empresa espanhola radicada aí na Argentina. A Petrobras mantém 70%, e a Repsol, 30, com um negócio denominado troca de ativos.

Eu te digo assim que para mim foi, eu me emociono até hoje quando eu trato desse assunto, porque a Refap, todo esse movimento, às vezes até fico meio, associando a idade que nos conduz às vezes essas emoções fortes. Mas a Refap para mim é uma espécie de filha dileta. Foi uma violência, como você ver uma filha sendo estuprada, é uma coisa inconcebível. Acho que para o gaúcho principalmente, que mantinha arraigada, até porque a história da Refinaria Alberto Pasqualini encerra uma luta muito intensa, foi uma luta política muito grande a implantação da refinaria lá, por dois motivos: primeiro, estava fase de consolidação da Petrobras, 62 - nós tínhamos o quê? Mataripe, Cubatão, Duque de Caxias, e as pressões eram muito grandes contra a empresa, não se permitia espaço de crescimento, desenvolvimento, a figura da doutrina nacionalista sofreu toda sorte de ataque na discussão da criação do petróleo, da indústria de petróleo, e o governo - ou melhor, o governador na época era Leonel Brizola, que trazia toda aquela trajetória de ebulição, ele foi quem desapropriou a área para construção da rRefinaria. E foi uma luta constante, uma luta política na concepção da palavra, as forças reacionárias contra, a Refap entre 64, quando eu entrei, até ela tomar um ritmo acelerado de obras, que a coisa andava num passo de carga, as dotações sofriam escassez de recurso, a gente num determinado período instituiu a jornada voluntária, se trabalhava sem ganhar hora extra para cumprir cronograma, sem, porque as dotações não permitiam o parlamento, uma coisa simbólica, mas havia envolvimento, e essa luta política foi vencida, entende? Entre 64 até 67, mais ou menos, se cogitou várias vezes que não deveriam construir a refinaria, mas aí a área já tinha tanques construídos, área de armazenamento já estava montada, alternativa que arrumaram para a área era um terminal da Esso. Parece. “Não, se constrói um terminal da Esso aqui”. Então isso revela que realmente fui dificultoso - assim como no Rio Grande do Sul, em Minas Gerais; o projeto é de irmãos gêmeos de projeto original. Um outro fator é a questão da fronteira; já tem toda aquela visão meio da Argentina poder invadir, tinha também esse componente não muito presente, não muito argumentado, mas se sabe que nas entrelinhas tinha, tudo isso foi vencido, realmente a política foi muito grande. E de repente você se depara numa realidade dessa botar a Refinaria dos Pampas para ser modelo de um modelo de gestão, realmente foi uma violência, um sofrimento para o pessoal muito grande.

Olha, acho que segue a lógica que se vê hoje ainda, e que tomara que mude - e eu diria, pelo que eu tenho acompanhado, está apontando para mudança - essa reestruturação, de modelos às vezes malsucedido em outras plagas que aqui está servindo como experiência. Então foi reestruturado aquele modelo todo que se tinha de recursos humanos, enfim, tudo isso modificou ipsis litteris o que eles praticam na Petrobras como um todo, com mais autonomia. Como é uma subsidiária, está mais desvinculada da administração central e tem mais autonomia para algum tipo de gestão. Enfim, agora, pelo que eu tenho acompanhado, não existe satisfação nessa troca, salvo aquelas pessoas que foram contempladas nesse novo modelo e têm, eu diria, algum tipo de favorecimento pessoal, não entro no mérito se procede ou não, mas aí esses são os que realmente se postam em defesa desse novo modelo. Mas a grande maioria dos trabalhadores não, e a veterania nem se fala, aquele envolvimento, a Refap, aquele orgulho, entende, realmente foi uma violência. E lamentavelmente nós enquanto entidade sindical ajuizamos na Justiça uma ação, apontando os prejuízos causados à empresa na troca de ativos, a Aepet nos subsidiou com estudos que comprovam, por exemplo, que o percentual que foi envolvido na troca do campo de Albacora foi subavaliado, entende? E entre outros ativos esse é um dos mais gritantes em termo de prejuízo provocado na troca de ativos. E está lá, os espanhóis, que não têm uma tradição muito humana de patrões, a demanda judicial está em curso, tem uma liminar que determina o cancelamento da troca, mas até agora de concreto não se tem nada assim, o negócio da transação continua, a espanhola Repsol, o pessoal já tem presença na refinaria, presença física. Na troca foi envolvida também uma refinaria na Argentina para a Petrobras, mais postos de distribuição, a Petrobras já assumiu lá há algum tempo e parece que o negócio está em franco andamento, eu diria que na prática está consolidado, mas tem esse ops aí, essa demanda judicial que a gente torce e espera que tenha sucesso. E também agora nesse novo cenário, embora até agora não tenha sido sinalizado nada favorável, a gente espera realmente que algumas modificações ocorram.

A expectativa, eu diria para mim eu prefiro dizer que é de otimismo, entende? De que alguma decisão política realmente trave esse processo. A leitura, eu diria assim, mais direta que se faz é que foi uma cunha aberta no seio da empresa, daí para frente é só uma questão de tempo, que na prática o monopólio foi quebrado, o monopólio existe, é da União - quer dizer, a Petrobras tinha um monopólio da exploração.Tinha o exercício do monopólio, perdeu, agora todo mundo pode, e esse arranjo aí de parceria, que realmente é complicado, nessa indústria, entende, não há, não tem meio-termo: ou é ou não é. A gente vê aí no cenário mundial, os acontecimentos do momento revelam que a questão do petróleo é crucial para qualquer nação. E o mais frustrante é o seguinte: a gente olha para, trás viu-se no início, na campanha “O brasileiro é limitado, é burro, não tem tecnologia para bancar e criar uma indústria petrolífera, não tem recursos, não tinha nada e não tem petróleo”. E daí tu olha pra trás e vê o que a gente progrediu no setor, às nossas custas sob todos os aspectos, de recursos financeiros, de desenvolvimento de tecnologia, de criatividade do homem brasileiro, entende? Aí, escutando um dia os expoentes do setor, a questão das águas profundas revela muito bem, por que se conseguiu? Porque investiu - por que investiu? Porque tínhamos necessidade de desenvolver know-how da tecnologia, e chegou o ponto, quer dizer, a fase crítica passou, chegou a fase de maturidade. Aí é um tiro, eu diria assim uma facada, né, o tiro, uma produção aí beirando a auto-suficiência e está aí.

A OPÇÃO PELO SINDICATO

Eu acho que o fato de eu ter concluído um curso superior, que na época sob o ponto de vista financeiro era muito promissor; hoje está meio complicado - inclusive eu tenho uma filha que se formou e tem dificuldade muito grande, mas na minha época realmente era promissor, os meus contemporâneos de faculdade hoje estão numa situação, eu diria, confortável, sob o ponto de vista financeiro e econômico. O fato de eu ter feito uma opção revela que eu fiz e faria de novo, a par das frustrações, porque eu distingo o dirigente sindical do petróleo - na sua grande maioria uma mescla de gente, de petroleiro, entende, de uma espécie assim de um responsável a mais por alguma coisa, que é a nossa empresa. Então realmente, sob esse ângulo, é muito gratificante. Agora, quando chega na fase que a gente está hoje - quebra do monopólio, a estruturação, troca de ativo -, é um pouco frustrante, é realmente. Não sei se a gente consegue explicar como é esse tipo de sentimento, se revela gratificado, se revela frustrado, talvez eu não encontre palavras, não tenha condições de expressar isso, mas realmente é isso.

FAMÍLIA TERIA MAIS ATENÇÃO

Olha, existe de fato no seio familiar uma cobrança muito grande, isso aí a realidade mexe um pouco, entende, quer dizer, eu não sei, eu tenho a impressão que eu não consegui dosar direito a figura do pai, do marido com dirigente sindical, então a prioridade foi Petrobras, sindicato com, eu diria assim aquele entendimento que tinha que haver compreensão, eu acho que hoje eu tentaria dosar um pouco mais isso, realmente hoje a gente olha, à medida que afloram, eu diria assim algumas conseqüências desse tipo de conduta aí o questionamento, o autoquestionamento é um pouco forte. Então eu acho que nesse particular eu tentaria fazer uma mescla mais equilibrada de militante sindical, defensor da Petrobras com marido e pai - eu acho que seria a única mudança, entende? Com relação à escolha propriamente dita eu já revelei, quando eu negligenciei, resolvi: “Vou ser cirurgião dentista e continuar a ser dirigente” a coisa foi feita, tanto é que a cachaça está aí presente, acho que não tem ar que me demova do que eu faço aqui, continuo, estou todo dia lá no sindicato, faço parte do Conselho Fiscal, a comissão está sempre ali, entende? De repente até o fato de hoje no contexto de outra geração às vezes ser considerado, ser tratado como uma espécie de um paizão, um irmão mais velho, isso aí também pesa, né?

FOME ZERO

É, eu diria que é duro, é duro realmente, ontem encontrei duas pessoas contemporâneas de militância, principalmente nessa questão da defesa do patrimônio publico, enfim, eu revelei a frustração diante desse cenário que se vive hoje no mundo. Você olha para trás, toda essa trajetória de militância em busca de liberdade, enfim, bem-estar, impor aquelas coisas, eu não diria bandeira, aquelas convicções que a gente caiu e se depara numa situação dessas realmente não é fácil, né? Então o sonho que eu tenho primeiramente é ver o meu país - eu sei que é viável, é um país rico, um povo... De repente no século 21 a gente está brigando pelo Fome Zero, né? Então o sonho que eu vejo é esse aí, quem sabe alguma coisa se construiu, na próxima geração futura aí seja realizado, eu acho que o depoimento não foi para isso, né, mas de repente.

Eu cheguei já avaliar alguma coisa, assim, no âmbito das pessoas chegadas, os companheiros, dizer que eu acho que pelas características da nossa empresa, como ela se criou, como ela cresceu, como se formou, enfim, isso é uma dívida, sem dúvida nenhuma é uma dívida. Bom, sem dúvida que a iniciativa é louvável apesar desse reparo da dívida, mas está sendo saldada, está, a expectativa que realmente esse trabalho tenha o sucesso, o alcance do que se deseja, né? E para mim eu diria que foi um privilégio, talvez até atenue um pouco às vezes o reparo, né, que a gente faz em termo, e tem esses momentos de reflexão, a gente olha para trás, às vezes o momento não é muito propício para isso, a gente faz lá o questionamento, né? Mas eu acho que deve não só o meu como outras pessoas pelas informações que eu tive aqui que estão sendo alvo dessa memória que transmita alguma coisa, quem sabe? É muita pretensão, mas o sonho é quem sabe daqui talvez alguns anos a Fome Zero seja coisa do passado.

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